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1.3.11

Elektra

Pois é, o blog volta à vida. Mas antes de dedicar-me a assuntos mais sérios, um pequeno interlúdio de fã.



Em algum lugar na minha busca incessante por quadrinhos interessantes, e já satisfeito de Carl Barks, Hergé e Maurício de Souza, os quadrinhos mais vendidos do mundo bateram à minha porta.

Na verdade foi culpa de um filme do Batman com uma publicidade absurda e uma imensa curiosidade mórbida adolescente por um mundo que, nas páginas, vinha estampado “leitura para adultos”. Eu tinha lá meus catorze, e achei tudo aquilo sinistro, sombrio, realista. Um mundo onde as pessoas morriam e vilões eram terrivelmente assustadores.

Claro que eu li os grandes clássicos do morcegão, e tremi de medo do Coringa enfiando um tiro na coluna da Batgirl para provar sua teoria. E tremi de arrepio quando o Batman meteu a mão na cara do Super-homem que se tornara um joguete nas mãos do poder constituído. O grande astro desta era do morcego era Frank Miller, e logo em seguida (eu ainda não lera as obras supremas dele) eu admirava um tal de Alan Moore.

E Frank tinha uma carta na manga. Alguns amigos meus á estavam versados no cara graças a outro personagem que ele transformou em um ícone, o Demolidor, da Marvel. Eu não era, e até hoje não sou, um grande admirador do jeito Marvel de quadrinhos, com raras exceções. Mas Miller era Miller, e li tudo que pude do Homem sem Medo, Matt Murdock, sob o disfarce do demônio ousado.

Até que caiu em minhas mãos a história em que ele reencontra com uma ex-namorada que se tornou uma assassina de aluguel. Elektra.

Anos depois soube que foi a primeira história que Miller roteirizou para a Marvel. Logo que teve a oportunidade, ele jogou o novaiorquino até o osso Matt Murdock em um mundo de ninjas, artes marciais e misticismo arcano oriental. E colocou a bomba envolvida e uma mulher de traços musculosos, poucas curvas e cara de que castraria qualquer um que tentasse alguma graça com ela. O oposto absoluto de todas as mulheres já retratadas em quadrinhos até ali.

Elektra é a antítese da Mulher Maravilha ou das X-girls, de Lois Lane ou Barbarella. Depois de ler tudo que Miller fez com ela nas histórias do Demolidor, sua vida e morte, caiu em minhas mãos a síntese do que aquela personagem queria dizer ao mundo.

Em “Elektra: Assassina”, toda aquela podridão de mundo escondida e atenuada nas outras coisas com advertência de “leitura para adultos” desaba com o peso de um Sartre de porre e um Nieztsche virado no cão. Sangue é o que menos chama a atenção. Temos traição, complexos freudianos, manipulação, conflitos políticos, um mal absoluto controlando o horror nuclear, hospícios cucarachas, estuprador virando herói, hippie virando monstro, maionese podre e uma ninja absolutamente assassina sem nenhuma hesitação em chacinar pessoas que estão do lado do bem para atingir seu objetivo de salvar o mundo por vingança.

E de repente, o que falta no mundo é uma pitada de Elektra. O politicamente correto transformou essa criatura sem piedade em uma coisa insossa interpretada pela boneca-de-lábios-botox Jennifer Garner.

Posteriormente, Miller a matou de vez (em “Elektra vive”) e foi se dedicar a petardos como “Sin City”, mas nunca superou-se como fez com “assassina”. Daí os executivos da Marvel a ressuscitaram ao melhor estilo X-men e deram-lhe curvas saborosas, preceitos morais caretas e arquiinimigos superpoderosos convencionais.

Mas até hoje, Elektra é a maior personagem feminina já criada, e infelizmente foi esquecida atrás de uma versão sua de peitos enormes e profundidade de um pires.

Volte, Elektra, e mate os executivos que fizeram isso com você.

7.2.10

Retratai-vos.


Frazetta: músculos, sexo, monstros, mais músculos no monstro, curvas, mais músculos nas curvas, e toda a potência de um jumbo em uma só cena.

Entre os muçulmanos, existe uma lei religiosa que impede a retratação gráfica de seres humanos (em algumas alas mais radicais, não só humanos). A idéia essencial é de que a criação é exclusividade de Deus e portanto é pretensão humana achar que podemos retratar aquilo que é considerado o ápice da obra divina.


Thor, ou "como Walt Simonson retrata a ação de um Deus contra monstros".

Isso nos deu os maravilhosos afrescos, texturas, arquitetura e arabescos do mundo islâmico, mas em compensação tolheu os artistas muçulmanos de criarem as histórias em quadrinhos, os equivalentes africanos e árabes dos retratos renascentistas e muitas outras formas de representação em escultura, desenho e por aí vai.

A arte em geral é reconhecida como o poder da expressão do mundo interno da criatura senciente e auto-consciente. Dentre as artes clássicas, reconheciam-se seis artes:
1ª, a Música, 2ª a Dança, 3ª a Pintura, 4ª a Escultura, 5ª o Teatro e 6ª a Literatura. Posteriormente, o cinema se tornou a 7ª.


Carmine Infantino: o mestre da velocidade em um papel estático.

Outras artes foram sendo agregadas desde o século 19, embora só o cinema tenha desfrutado de um posto cativo na lista. Ninguém discute que a fotografia é uma arte, mas seu posto de 8ª arte é posto como algo forçado por muitos críticos (dos quais discordo), assim como outras formas expressivas típicas da modernidade. Parece aquela criança birrenta tentando ganhar um lugar na mesa dos adultos. Os quadrinhos seriam a 9ª arte, e são mesmo uma expressão única. Os Videogames (ahahahah) a 10ª e a arte digital (photoshopar capa da play-boi vale?) disputaria o 11ª posto.


Shimamoto, o mestre do PB Brasileiro. Medo!

Não se discute o papel de cada representação destas, mas abrir demais o leque além destas 11 fica difícil. O videogame é altamente discutível, diga-se de passagem, dado que não se cria videogame sem pretensão de lucro e sem todo um esquema empresarial por trás dele. A videoinstalação, audioinstalação, cinestesioinstalação não são capítulos à parte nisso tudo? A arte não é inerentemente inútil, como dizia Oscar Wilde?


O Brasil tem seus supers. Raio Negro, Capitão 7 e Velta.

Tudo isso para dizer: amo quadrinhos. A representação humana nos quadrinhos é algo que extrapola o realismo, finca as bases de uma nova forma de retrato mítico da saga do herói, do poder imensurável, do mal em sua mais monstruosa roupagem, tudo isso junto! Os quadrinhos (mais uma coisa desconhecida) nasceram no Brasil na sua forma hoje conhecida, descendentes diretos das charges do século XVIII, mas apenas após jornais americanos publicarem tiras no formato se tornaram conhecidos do grande público mundial.


Desafio-te a encontrar um rosto igual a outro em um desenho de George Perez.

Não dá para imaginar como os antigos gregos imaginavam seus heróis míticos sem pensar que de alguma forma eles tinham em suas imaginações o poder de retratação que vemos hoje nos quadrinhos. Afirma sem pestanejar que a tecnologia de efeitos especiais evoluiu por pura inveja do poder dos quadrinhos de representarem o absolutamente irreal, e não é coincidência que o lucrativíssimo ramo do cinema de super-heróis ganhou espaço quando Matrix detonou os limites do que pode ou não ser mostrado em uma tela.


Frank Miller em sua melhor história, mas antes dos delírios gráficos belíssimos de Sin City.

Portanto, senhora mãe, senhor pai, quando seus filhotes estiverem com uma revista do Wolverine nas mãos, não o censure, não o mande fazer redação. Dê para ele o "Eu sou Wolverine", de Frank Miller e Chris Claremont, e digam que se ele quer ler o velho carcaju, é com aquilo que ele deve começar. Pois daquilo lá para encarar "Shogun", Jack London e Ernest Hemingway é um pulo.

Quando seu filho perguntar o que é um morro carioca, deixe-o ler o Zé carioca do Renato Canini (abaixo). É mil vezes mais saudável do que assistir qualquer filmeco favela-gangue-pobre-e-preto-se-matando tão ao gosto da classe média conservadora do país.


E quando ele começar a te perguntar se você tem um CD com a abertura 1812 do Tchaikovski, pode acreditar. É culpa de "V de vingança".